domingo, 22 de julho de 2007

DESALENTO






Nós, que confiávamos tanto,
porque, de tão cândidos,
não compreendíamos a realidade.
Nós, que desenhávamos tanto,
porque, de tão silenciados,
mal intentávamos usar palavras.
Nós, que sonhávamos tanto,
porque, de tão tolhidos,
só contemplávamos o futuro.
Nós, que nos amávamos tanto,
porque, de tão desdenhados,
bastávamo-nos a nós mesmos.

O que fizemos de nós?
Escoramo-nos
no que fizeram de nós
e ali nos acomodamos.
Emaranhamo-nos
naqueles mesmos nós...
Nós, que tanto os
repudiamos.

Deixamo-nos
esmorecer e permitimos
que se puíssem nossos
mais profundos laços.
Não mais confiamos,
foi-se a inocência...
Não mais desenhamos...
As palavras, não medimos...

Não conseguimos
(ou não soubemos?)
construir o que sonhamos.
Pesadelos nos açodam,
adormecidos ou despertos.
Não mais nos bastamos
– até nos desdenhamos.
E a nada disso resistimos...

Justo nós,
que nos amávamos tanto.

Justos nós.

Ata-me

Ata-me
noites a fio.
Enovela-me
na tua aflição
agora que a compaixão
não me alenta mais.

Dilata-me
as pupilas desgastadas.
Desgraça-me
a última visão
agora que a imaginação
nada me traz.

Extirpa-me
o nodo.
Exorta-me
do engodo.
Por mais que eu me debata
ou que a ti revele
o que já não há mais
na carne.
Cerne da questão...
que se resume
a uma decisão:
luz ou sombra,
fato ou ficção.

Agaphantos




No jardim de Monet estive, por ti,
a apreciar-lhe os agapantos garbosos.
Ao vê-los, porém, mal os reconheci.
Bem poderiam ser outros. Tão viçosos!

O que teria ocorrido? Era o que eu pensava...
Mantido está o cenário... Tudo igual no jardim...
E enquanto o olhar cuidadosamente rastreava
Entendi que a mudança tinha ocorrido em mim.

E eu gargalhei, tamanho foi o meu espanto,
ao perceber que o que eu imaginava ver em ti
era o que vislumbrava, ali, em cada agapanto...

As hastes determinadas, erguendo-se flexíveis,
num floral tributo ao mais forte amor que existe:
o amor a si... Pois é somente assim que possíveis

... se tornam todos os demais “amores”.

Não consegui definir, de pronto, o que sentia...
Inflamei-me de algo, a pulular-me aqui e ali...
Parecia, no início, uma intensa alegria...
mas era mais, muito mais. Logo entendi.

Era orgulho, imenso e intenso. Me preenchia...
Infundia-se, irradiava-se a cada inspiração.
Não duvidava de ti, no fundo eu sabia...
Só não esperava tão breve realização.

Ponho-me, agora, a imaginar-te pleno,
feliz por ter-se havido a vida, a soberania
e a estima, a tua própria e a dos em torno,

agregando ao que escolheu chamar L' Héritier
de agapanthus, o brilho desse júbilo – teu amor
florescente –, no jardim pincelado por Monet.



Diálogo entre botão e regato

Delicado botão
flor em esboço
acuado e infeliz
O que te aflige?

Nada, pois nada há,
do nada vim,
ao nada voltarei.

Singelo regato
rio em esboço
corajoso e afoito
O que te anima?


Tudo que agora há
onde antes nada havia.

Pequenino botão
projeto de flor
amargo e aborrecido
O que te susta?

Tudo, pois nada sou,
nada tenho,
nada me seduz.

Diminuto regato
projeto de rio
decidido e ousado
O que te move?

Nada em mim.
O que me conduz
é o que me rodeia.

Inquieto botão
flor anunciada
descrente e enfarada,
o que temes?

Tudo que há no roteiro
do previsível espetáculo.

Caudaloso regato
rio anunciado
confiante e pertinaz,
o que ganhas?

Um curso
e suas paisagens,
algumas espetaculares...

Fezes, urina,
pneus e garrafas...
A vida em dejetos, com
seus peróxidos e nitritos.


Aprendizado,
sabedoria...
Uma história
e seus riscos.

Um traço, que seja,
em um mapa de algum
atlas de geografia.

Fosse uma pétala
seca e desbotada
em meio às páginas
amareladas de um livro...

Fosse um grama
de perfume diluído,
mascarando odores
em uma latrina qualquer?

Ainda assim,
tudo valeria a pena.
Isso é a vida!

Uma pena. Ainda.
Nada vale por si.
Assim é a vida...

Reminiscências de uma loba e um vulcão

Canis lupus

Mamíferos canídeos, carnívoros e selvagens, de hábitos noturnos.
Predadores, caçam em grupos e submetem-se a rigorosa hierarquia.
Diferenciam-se, em porte e pelagem, por esse mundo afora.
Evitam o homem, pois não costumam ficar onde não são bem-vindos.


Vulcanus

Aberturas por onde a expressão fluida do magma, aflora à superfície.
Originam-se do movimento de placas terrestres na camada litosférica.
Diferenciam-se pelo magma expelido e pela forma esculpida pela lava.
Podem permanecer em letargia ou irromper em brutais erupções.
O magma, porém, ao passar por elas, nunca mais será o mesmo.

Seductoris

Olhar instigador e pelagem macia fazem da loba uma bela e sedutora presença.
Mas há muito mais que beleza aparente.
Coisas que ao senso comum nunca se revelam.

[para ver além, compreender é preciso]
A atração é certa e, quase sempre, fatal.
É preciso muita sabedoria para se aproximar.
Há quem se contente com o que a superfície revela.
Estes jamais ultrapassam a epiderme calejada.
Há os que ultrapassam, mas não conseguem respeitar
a liberdade-loba e nem desfrutar da loba-transparência.

[para conviver, retribuir é preciso]
As feridas que essa ousadia provoca nunca cicatrizam.
E jamais lhes será dada uma outra oportunidade.

Intuitionis

É preciso muita perspicácia para perceber a abertura que existe.
Não há indícios de lava, uma camada sequer.
É que a latejante intenção do magma em esvair-se
foi menor que a hesitação da abertura em explicitar-se vulcão.
[E será preciso uma erupção para vir à luz um vulcão?]
Foi assim que o vulcão se guardou, retendo tudo aquilo
que queria vir a ser, por temer as seqüelas da erupção.
Precisava compreender em que consistia o seu magma
por mais que a pulsação em seu íntimo lhe dissesse: é "coisa boa".

[fantasia, intuição? Como sabê-lo antes da erupção?]
E se resguardou enquanto aguardava. Sem saber,
direito, para que. Mas, sabendo, no fundo, por quem.
Aguardando, talvez, uma sedutora presença, disposta
a compartilhar um mergulho em magmas nunca dantes navegados.
E, ainda, aguarda. Aguarda a hora de vê-la
– livre, bela, transparente – e reconhecê-la.
[seu enxergar envolve sentidos ainda não listados pela ciência]

Resplendoris

A lua cheia é um momento especial na vida lupina. Como a lua,
a loba vive refletindo luz. Vaga noites coletando fótons.
[acumulando energia para a resplandecência]
Singelos fótons que indiferentes desprezam, pessimistas
descartam, presunçosos subestimam e obstinados nem percebem.
[substituindo trevas por luz]
Ao contemplar o anil do céu arrebatado pelo luar,
apinhoado de estrelas, a loba uiva madrugada adentro.
O uivar saúda a luz que se impõe às trevas
revigorando esperanças, revelando o que é preciso ver.
Mas o uivar é, também, advertência:
as trevas avançam e não tardam a perseguir e sufocar a luz.
Projectus

O vulcão aguarda sentir-se forte, preparado e encorajado
a deixar a erupção simplesmente acontecer.
[decisiva projeção de seus anseios mais secretos]
Precisa se sentir seguro para resistir ao calor do magma,
e sobreviver ao turbilhão de lava, gases e cinzas.
A erupção é um risco iminente de afastar-se
do que anseia ser

[e gosta, e quer, e precisa]
e perder-se no que esperam dele.
Após ser sufocado pela nuvem de cinzas, precisa de luz
para ver o que restou e em que se transformou.

Fraternus

O afeto lupino não tem limites mas só é dedicado
a quem o deseja e dele necessita.
[sua solidariedade extrapola as fronteiras taxionômicas da vã biologia]
Assim, é comum a loba acolher toda e qualquer
criatura abandonada à própria sorte.
[quem sabe, a vida possa, assim, ser menos selvagem]
Mas não é o que a loba faz ou diz que ajuda
quem a segue na selva da vida. É o que a loba é.
[seu exemplo fala mais que mil palavras]

Semeia amor, colhendo alegrias.
Com humildade, cultiva amizades.
Da perseverança, faz brotar sucessos.
[estimula a honestidade, exercendo-a]
Ensina a caçar, ao invés de trazer a caça.
Sugere caminhos, ao invés de traçar roteiros.
[respeitando, valoriza o respeito]
Ampara sem carregar, abriga sem sufocar.
E pelos caminhos que trilham,
enfatiza as flores, mais que os espinhos.
[incentiva a compreensão exercitando-a]
A responsabilidade é o que há de mais arraigado na atitude-loba:
lhe faculta agir sem nunca abrir mão de sua liberdade e dignidade.

Secretum

Em seu vulcânico íntimo, o magma reclama,
para aflição do estéril, o fim da letargia.
[não é fácil conter o magma]
A vida exige e a natureza clama a fecundidade
intrínseca à erupção temida. A terra, ordena.
O vulcão reluta: não quer reter em si nada
que não seja seu, mas não quer perder-se de si mesmo.
[é esse o seu mais íntimo segredo]
Precisa reconhecer-se em sua imagem refletida,
para não se extinguir à primeira erupção.

Singularis

A loba não se ocupa em desvendar mistérios. Simplesmente
permite que a natureza se manifeste e a vida flua.
O mundo lupino não é explicado, é vivido. Cada desafio
é enfrentado com o que se possui no momento que ele surge.
Não há oposição às forças genuínas da natureza.
Porque a loba sequer percebe a si como algo dela distinto.
[sua língua não usa pronomes pessoais]
A natureza se expressa por múltiplas formas – seja uma loba,
seja um vulcão – em constante interação e produzindo novas formas.
Assim, não há meias-palavras, pseudo-certezas,
verdades absolutas, tampouco dogmas.
[nem id, ego ou alterego]
Há, somente, um intenso presente, repleto de demandas,
e um passado saboroso, recheado de experiências.
Não há, para a loba, com o que se pré-ocupar: basta fazer
o que está por ser feito assim que a natureza ordenar.
Para isso, ela não precisa saber o que é, o que pode vir
a ser, de onde veio ou onde vai chegar.
Assim é a loba. E vem sendo sempre assim, mesmo antes
de lhe chamarem loba. Sua singularidade prescinde de um nome.
Por isso não padece de conflitos de identidade, auto-estima ou existência.
Por isso a distância que mantém da humanidade.
Impetus

No fundo, o vulcão não se move porque tem medo.
E então aguarda. Um estímulo, um exemplo, um motivo...
[ou um milagre?]
Ao menos, se houvesse fé... Mas não há nem montanha...
Somente um cansaço enorme e uma vontade de jamais ter existido.
[aparente sanidade ou nebulosa loucura?]
E a loba pensa no que seria sem as noites e os luares...
[o vulcão nem imagina...]
E no que tem sido das criaturas que a indecisão do vulcão vem privando...
[ele nunca pensou nisso...]
E no que será da Terra se houver muitos vulcões indecisos...

Pela primeira vez, o futuro preocupou a loba.

Pela primeira vez, o vulcão sentiu-se forte.

Tragos




Sombras sobem na parede azul,
Sobras da fumaça que trago,
Que arde e afaga o meu peito.
O que quero ou faço, se é direito
Não penso. Assim não me corrijo.

Sobre o azul da parede sobem
Sombras, sobras do que trago,
Do que me entorpece e exalta.
Penso em tudo que me falta.
Esqueço. Assim não me aflijo.

Sobram no fundo azul, sombras
Que sobem daquilo que trago,
Do que me degenera e enleia.
Penso em tudo que me rodeia.
Desdenho. Assim eu me alijo.

O cigarro acaba, cessa a fumaça.
Na boca, resta o gosto amargo.
Arde o peito, que a emoção invade.
A razão enxerga sombras na parede,
Sobras do que não trago, há muito.



Coração... Sem noção




Canto, pois meu pranto
teima em não rolar.
E é tanto, que meu peito
não vai suportar.

Em versos, vão surgindo,
das lágrimas, palavras
a embalar o lamento
contido em meu coração.

Viver sem amor
não é fácil, eu sei.
Mas amar é uma estrada
calçada de sofrer.

Quisera retificar esse
meu velho coração,
que só sabe bater por amor,
afogando-se em dor.

Será que foi apenas fantasia
o sentimento de magia
que afastou de mim a solidão?

Ou então, não enxergar a amargura
daquela pobre criatura
foi culpa só da euforia da paixão?

Por que ela não pôde aprender
e eu não soube lhe ensinar
a se dar sem exigir o receber?

Por que tem tanta pressa em julgar,
em não ouvir, em só falar,
nenhum esforço faz pra compreender?

Será que se acha dona da verdade
ou enxerga outra realidade
e sua vontade está acima da razão?

Ou então, ao trabalhar seus sofrimentos
enovelou seus pensamentos
e não consegue perceber a confusão.

E eu pensando poder ajudar
só consegui me machucar,
agora vou tentar tratar do que restou.

E estou me amparando na poesia
me esquivando da euforia
que faz meu coração pular...

(Ele é sem noção!)



Impasse





Se uma leve esperança confiada à vida
amainasse a dor pungente desta chaga
trazendo algum alento a esta despedida
alimentando o nume que se apaga...

Pudesse a esperança creditada à vida
conter a aflição que aos ventos se propaga
pois mesmo a persistir o intento de partida
velar-se-ia, assim, a impressão da saga.

Somente a esperança a comoção embarga
Embora não abrande o golpe da investida
Tampouco suavize o fel que se amarga.

Não fosse a esperança à rocha arremetida
No mar de injúrias em que o amor naufraga
Acolher-te-ia, feliz, assim que arrependida.



Pontuando



Só, sei que nada sei
sei que nada sei
que nada sei
nada sei
sei.

Só, que nada sei
que nada sei
nada sei
sei.

Só, que nada
que nada
nada...

Só, nada
nada...

Só, sinto muito.
sinto muito.
muito.

Só, muito.
muito...

Só.



Dolores



Dolores?
Temos todas,
o que vai querer?

Graves, crônicas e agudas,
No ponto e mal-passadas,
Adormecidas e lancinantes,
Superficiais e profundas,
Despertas e moribundas,
Dilacerantes e latejantes.

Dolores de todo tipo,
De cama, mesa e banho,
Novas, piratas e usadas,
Sintéticas e naturais,
Nacionais e importadas,
Industrializadas, artesanais.

Dolores?
Temos todas,
é só escolher.

Dolores de qualquer gênero
Adultas, jovens e infantis,
Masculinas e femininas,
Rústicas e sofisticadas,
Tradicionais e modernas,
Discretas e arrojadas.
Dolores de toda a sorte,
Esfolados na pele e no ego,
Fraturas de ossos e afetos,
Isquemias em partes e crenças,
Abortos de filhos e projetos,
Roturas de cistos e avenças.

Dolores?
Temos todas,
como vai querer?

Polida, áspera ou incrustada,
Grande, pequena ou menor,
Prêt-à-porter ou sob medida,
Fel, tutti frutti ou sem sabor,
Branca, negra ou amarela,
Atacado, varejo, promoção.

Na ficha, à vista ou parcela,
Cheque próprio ou terceiro,
Débito em conta ou cartão,
Vale, boleta ou dinheiro,
Em domicílio ou no balcão,
Frete incluso ou a cobrar.

Quem vai escolher?
Quantas quer levar?
Quantas vai deixar?



Amares que vêm para bem




Amar...
Singulares momentos a eternizar nosso tempo finito.
Comichão do destino no livre-arbítrio...

Amar...
Causa das causas, com cem ou sem razões,
com ou sem seqüência, e efeitos imprevisíveis...

Pode não ser bom nem fazer bem.
Pois amor e amado nascem juntos.
A ninguém é facultado escolher.

Porém, faculdades e juízos fora,
na ubiqüidade do amor eu pude,
por acaso, descobrir um bem.

Amanheço e amo o arrebol
que anuncia um novo dia,
ou então a nuvem que retarda a claridade.

Amo, igualmente, o sonho derradeiro
do despertar, a despeito da urgência
que consome meus dias.

Amo o frescor molhado, florido e folhado
do asfalto, tanto quanto a árvore
que a chuva desnudou.

Amo (e por que não?) a espera do lotação,
raramente fugaz e sempre
indecisa: 3A ou 3B?

Amo cada rosto que a rotina me traz,
e, mais ainda, o sorriso em projeto
que a timidez reprime.

Amo a mesmice que o trajeto exibe,
tanto quanto as efêmeras novidades
que o amanhã oculta.

Amo o desconhecido que se revela
familiar e, também, o não-familiar
do conhecido, que o convívio expõe.

Amo a inépcia vertiginosa que tolero
no fluir do dia, graças à sabedoria
que a vida me ensejou.

Amo a vida e os viventes,
ainda que distantes, e estendo
esse amor, também, a mim mesma.

Amo despertar e saber aguardar
e decidir, perceber e tolerar,
distinguir e respeitar.

Assim, serenamente, espero a comichão
do destino infundir sensações outras
ao amar nossode cada dia.

A Baco




Que conta é essa
que ainda devo,
que não se apaga?
Devo essa ainda?

Se devo, é essa.
Que eu não nego
porque nem devo
negar ainda.

Essa conta,
que não se há
pago... E nem,
talvez, devido.

Contam que devo.
Será? Ainda?
Que conta é essa
que não se paga?

É mesmo isso
que devo ainda?
Se é que devo,
como se paga?

Que contas mais
Ainda devo?
Devo contar?
Ainda essa!



Em Teias


dias a fio
sombras projetadas nas paredes
emaranham-se
em teias
de aranhas que
tecem teias onde
emaranham-se
sombras projetadas nas paredes
dias a fio


Há mar




Mar sereno em vaga
sinfonia do vai-e-vem,
nostalgia do leva-e-traz.
Incessante ir,
que nem sempre leva.
Torturante vir,
que nem sempre traz.

O olhar, inquieto, indaga
às ondas murmurantes:
o que está por vir?

Na imprecisa sintonia
das ondas reticentes
a razão, confusa, divaga.

Mar sereno avança,
anoitecendo
em nostálgica sinfonia.
Incessante ir,
que nem sempre traz.
Torturante vir,
que nem sempre leva.

Vagas sombras
rondam a noite
em ondas de melancolia.

Sombras dos sulcos
que a vida traça
ao escorrer em fios.

Melancolia avança
embalada
em sinfônica nostalgia.
Incessante ir,
quase nunca leva.
Torturante vir,
quase nunca traz.

Sombras de imagens
que o dia aloja
nas ondas do córtex.

Imagens e rostos
que a vida enruga
no fluir dos dias.



Escuridão avança.
Mais um dia se foi.
E a vida se esvai.
Incessante ir,
quase nunca traz.
Torturante vir,
quase nunca leva.

Por onde navegas, coração?
Ao sabor de ondas,
num leva-e-traz em vão?

Manhã vem, em neblina.
E Ilumina, lenta e calmamente,
o mar, que recua sereno.
Incessante vai-e-vem
Torturante leva-e-traz.

Ao sabor das ondas
que levam e trazem (em vão?),
coração navega alheio
ao vai-e-vem do olhar
ao leva-e-traz da razão.

Com a vaga impressão
de ser novo...
De novo...



Sobre a foto